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sábado, 20 de fevereiro de 2010

Felipe Augusto: “Os dirigentes são uns patifes”

Fonte: Tribuna do Norte
Júnior Santos

O advogado Felipe Augusto disse estar atento às várias irregularidades que estão em andamentoPresidente do Sindicato dos Atletas Profissionais do Rio Grande do Norte, o advogado Felipe Augusto disse estar atento às várias irregularidades que estão em andamento dentro dos clubes e do futebol potiguar. Ele protesta contra o fato da Federação Norte-Riograndense de Futebol estar permitindo o início de partidas sem a presença de ambulâncias no estádio e denuncia que em jogos realizados entre clubes do interior, sequer há a presença de um médico em campo, uma condição essencial para realização de uma partida de futebol. Em tom desafiador, o advogado também denuncia a relação promíscua entre os dirigentes e os empresários de futebol, que arrancam dinheiro do atleta usando os mais diversos tipos de expediente. Denuncia a diretoria do América de prática irregular, ao obrigar seus jogadores a assinar um documento de rescisão de contrato em branco, no ato da assinatura do contrato de trabalho e diz estar preparando duas ações judiciais em favor de Hércules e Diogo, ressaltando inclusive que houve a falsificação da assinatura dos atletas no documento de rescisão. Mas as polêmicas não param por aí.

Como anda a relação do advogado Felipe Augusto com os clubes? Elas são explosivas e chegam até a acusá-lo de tentar convencer os atletas a colocarem os clubes na Justiça.

Jamais fui a CT do América ou de qualquer clube buscar cliente. Eles é que me procuram, os jogadores já chegam em Natal sabendo quem eu sou da luta que tenho para defender os direitos deles.
O jogador de futebol é desinformado com quanto aos direitos dele em relação aos clubes?

São desinformados sim, a maioria deles não sabem nada em relação aos direitos.
Quais são as práticas mais cruéis em termos contratuais?

Os clubes daqui estão com uma praxe reprovável de obrigar o atleta a assinar um documento de rescisão contratual no ato da assinatura do contrato. Isso aconteceu com o América e já estou com dois casos autorizados a ingressar com uma ação judicial para tentar inverter essa rescisão.

 
Essa prática é ilegal?

Lógico que é. Você usa o seu poder de superioridade na relação patrão x empregado a se submeter aquele tipo de vexame. Se o atleta não aceitar assinar, não consegue o contrato.

 
Como é que o jogador deve agir diante disso?

Na iminência de ter o contrato negado, ele deve assinar, mas sabendo que quando for demitido poderá buscar os seus direitos na Justiça, onde o advogado tentará desfazer essa prática abusiva. No caso de Hércules e Diogo, ambos do América, já estou autorizado a tentar reverter essa prática nefasta na Justiça Trabalhista.

Teve alguma peculiaridade no caso desse dois jogadores do América?

No caso de Diogo e Hércules foi apresenta a rescisão deles e depois de 26 dias é que foi apresentado o contrato. O problema nesta caso é que para os olhos da lei, dá a impressão que os atletas foram quem pediram demissão. Ele perde o resto do contrato pela metade e mais a cláusula penal, que está sendo discutida, mas que eu entendo que é devida ao jogador. Além disso, existe também o Fundo de Garantia.

 
Existem outros tipos de ilegalidades como prática comum nos clubes?

Uma das práticas mais comuns e que continuam a fazer é assinar a carteira de trabalho com o valor diferente do salário que realmente é pago ao atletas. Para estes casos eu indico que os atletas recebam o pagamento e façam o depósito bancário para que se constituam num meio de prova no momento de se ingressar com uma ação trabalhista.

 
Os clubes costumam se defender alegando que fazem isso porque a parcela maior do salário é paga em direito de imagem. Isso não é legal?

Direito de imagem também é salário, é uma forma de fraudar. Do jeito que eles estão fazendo é uma clássica fraude ao contrato de trabalho, o ordenamento jurídico vigente não prestigia esse tipo de procedimento. Direito de arena? Também é salário.

 
Tudo isso deve constar então na carteira de trabalho?

Tem que está tudo registrado, tudo que o atleta percebe de luvas, bicho, esse mal fadado direito de arena, o próprio salário, a verba in natura para quem recebe auxílio aluguel. Tudo isso é salário, o pior é que os clubes sequer assinam as carteiras dos seus profissionais, que configura outra fraude. Como advogado e presidente do Sindicato dos atletas eu invoco os órgãos competentes a realizar uma grande fiscalização nos nossos clubes. Por tratar-se de contrato especiais com prazo determinado, eles são obrigados a assinar a entrada e a saída dos seus empregados e não reter o documento dos profissionais.

 
Esse procedimento acarreta algum tipo de ilegalidade?

Ele assina a entrada, deixa no clube sem dar sequer um recibo ao jogador, quando o atleta vai buscar e se não aceitar o que lhe foi proposto, os dirigentes retem o documento do atleta e depois dizem que o jogador simplesmente não apresentou a carteira de trabalho ao clube.

 
Como deveria ser esse procedimento de acordo com a lei trabalhista?

O jogador teria de entregar a carteira, receber um recibo do clube e 48 horas depois ir pegar o documento já assinado pelo clube. Esse procedimento deve ser participado com os demais colegas, pois caso seja necessária uma tutela juridicional eles possam falar a favor ou até contra o companheiro. É assim que tem que ser.

 
Como é que se resolve isso, basta o clube querer se profissionalizar mais?

Deveria fazer isso, mas os nossos clubes ainda estão naquela de fazer o jogador assinar contrato com uma rescisão em branco, isso é uma tremenda sacanagem. Isso vai contra a CLT, o clube não pode fazer um contrato com um jogador e esse por não jogar bem ele mandar embora.

 
Mas, isso não seria como uma espécie de justa causa, uma defesa dos clubes neste mercado louco do futebol?

Não isso não é motivo de justa-causa, só os motivos relacionados no artigo 482: ato de improbidade, embriaguez, abandono de emprego e outros, menos má produção. O risco neste caso é do patrão, do clube, da empresa de um modo geral. Pode ser do atleta em caso de embriagues, indisciplina. Neste caso tem que se buscar a justiça para que essa prática seja tornada unilateral por culpa exclusiva do empregador, jamais do atleta. Se ele provar que assinou a rescisão forçada, sob algum tipo de ameaça, a mesma será caracterizada como coercitiva.

 
Tem mais algo que não costuma vazar para a imprensa?

A lei que regula o trabalho de atleta profissional de futebol é clara. Diz que os contratos e distratos devem ser assinadas de próprio punho pelos jogadores. No caso do América isso não ocorreu. Eu tenho os contratos de Diogo e vou provar que o meu cliente não assinou a rescisão e que a assinatura dele foi fraudada por um rapaz chamado Glauco. Vou provar que essa rescisão assinada no dia 29 de janeiro foi ilegal.

 
Mas, isso também não é muita ignorância dos jogadores, não?
É.

 
Também não seria um pouco de má-fé dos ditos empresários do futebol?

O problema do empresário hoje é que eles se fazem de dirigente. É por isso que eu não tenho um atleta empregado em clube algum. Eu não posso defender os interesses do meu atleta e do clube ao mesmo tempo, o empresário depende do clube. Tem vários empresários atuando em Natal que não gostam de mim, porque ele joga o rapaz no clube, recebe o dinheiro do clube, divide com o dirigente na grande maioria das vezes e depois quando o atleta e jogado para fora do clube eles ficam procurando encaixá-los em outro lugar para evitar futuras ações trabalhistas.

 
Mover ações trabalhistas contra os clubes, não fecham as portas para os atletas?

E vai ficar sem receber? Arturzinho entrou com uma ação contra o América e depois esse mesmo América foi atrás dele. Tem outros tantos casos de jogadores que foram recontratados depois de acionarem os clubes judicialmente. Isso é comum no futebol. No futebol do RN tem vários casos.

 
O que você acha da classe dirigente dos clubes potiguares?

Com as exceções de praxe, a maioria é formada por patifes. Usam a imprensa para promoção pessoal, os clubes para roubar e os atletas para afogar os seus recalques por não ter conseguido um dia se tornar um jogador profissional. Isso é o que eu acho.

 
Você se arriscaria dizer nomes?

Eu cito o nome de um como injustiçado, Judas Tadeu. O ABC em que pese as injustiças sofridas por Judas, ele não errou por irresponsabilidade, mas por amar demais. Eu acho que ele não caiu na real ainda e não entendeu que a razão deve ser maior que a paixão. Por causa disso, o ABC só vai começar a pagar as dívidas de 2009, de forma mais efetiva, a partir de abril. O que foi pago até aqui foi besteira. Eles tem a mim como o cão tem a cruz. Eu já fui obrigado a deixar o Machadão num camburão da PM porque os torcedores não entendem que as dívidas dos clubes são feitas pelos próprios dirigentes.

 
A relação clube x atleta continua sendo brutal?

O atleta só é patrimônio do clube quando está no auge e rendendo bem. Quando machuca vai para o INSS e passa a receber o salário registrado em carteira, que é bem pequeno. Ai é um tal de gente passar fome e se desesperar, existem vários atletas nessa situação. Ben-Hur que ganhava R$ 16 mil no ABC, hoje recebe mil reais do INSS e mais uma quantia de quatro ou cinco mil por fora, está sendo muito injustiçado e é contra isso que eu brigo.

 
Ben-Hur manifestou o interesse de colocar o ABC na Justiça?

Não, eu apenas o orientei e espero que deem um jeito na situação dele, para que depois o atleta não venha a ficar como o maior prejudicado nessa história. Prejudicado Ben-Hur já está. Neste caso o melhor é haver uma negociação, quando não se paga apenas o que está na carteira e nem aquilo que foi acertado com o atleta. Os dirigentes daqui não podem ser encarados como dirigentes.

 
Como ex-presidente, como você vê a atuação do Tribunal de Justiça Desportiva no Rio Grande do Norte?

O TJD precisa passar por uma grande faxina. Depois que saí, constatei que o órgão é uma grande fonte de arrecadação de dinheiro. Isso tudo passa pelo enorme jogo de interesse que circula pelos seus pares, com raríssimas exceções, como o doutor Francisco Honório, Mirocem Ferreira Lima, Raimundo Nonato Fernandes e José Gomes da Costa. O Tribunal precisa ser comandado por pessoas desse nível. A qualidade do Tribunal está muito baixa. Existe uma insegurança jurídica muito grande.

O mandato de presidente do TJD tem a duração de um ano. Você passou apenas seis meses. Qual foi o motivo da sua saída?

Minha saída se deu pelo simples fato de que comecei a notar que os julgamentos eram cartas marcadas. Decidi deixar a presidência no dia em que um dirigente ligou para mim às 7h, dizendo que o julgamento estava empatado. Como meu voto seria o decisivo, ele me ligou pedindo minha “ajuda”. Isso, o julgamento iria acontecer só a tarde. Foi aí que percebi que não valia a pena continuar como presidente do Tribunal.

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